terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

No escurinho do cinema...

Há quem diga que ver filmes é perda de tempo, que são duas horas em vão de um dia. Já eu sou daqueles que pensam que duas horas de filme representam duas horas de vivências, experiências e aprendizados que dificilmente teríamos em apenas duas horas de vida. E, para essas últimas pessoas, não há época melhor para ir ao cinema do que esta.

Três produções que concorrem ao Oscar 2009 - duas delas em cartaz em Porto Alegre - me tocaram de alguma forma. Levando em conta que só vi três indicados ao prêmio, e que os três mexeram comigo, arrisco dizer que esta é uma boa safra.

A Troca narra a intrigante história verídica de uma mãe solteira que, após tentarem trocar o seu filho, luta contra o sistema corrupto vigente no final da década de 20. O filme concorre ao prêmio em três categorias: direção de arte, fotografia e melhor atriz. E é nesta última que se concentra a sua força. Angelina Jolie deixa de lado o papel de mulher fatal para assumir o de uma mãe recatada e aparentemente impotende que, obrigada pelos acontecimentos, se revela forte o suficiente para enfrentar todo um sistema no poder. E os absurdos a que ela é submetida nos fazem querer saltar da poltrona - embora nos acomodamos ao lembrar do quão impotente nos sentimos ante os governantes da nossa época, independente da época em vivemos.

O Leitor se encontra um pouco mais à frente, seja pela época retratada (a década de 40) ou pelo número de indicações (cinco, incluindo aí as principais categorias). O filme mostra a vida de um jovem estudante de 15 anos que se envolve com uma mulher mais velha e, anos depois, descobre que ela foi responsável por centenas de mortes de judeus durante o holocausto. O tema - holocausto - é mais do que batido. Mas, da maneira que o filme o aborda, ele chega a ser original. Ao contrário do que acontece na maioria dos filmes sobre o tema, em O Leitor somos jogados no meio do conflito: entre alguém educado, instruído, que percebe a barbárie que foi a morte de milhares de judeus; e alguém analfabeto, sem afetos, cuja vida sempre se resumiu a trabalhar para se sustentar. Pode-se considerar culpado quem por ignorância e até ingenuidade tornou possível o nazismo? Os conflitos não páram por aí. Estão também no relacionamento dos personagens, que sempre são velhos ou jovens demais; que quando estão longe se fazem presentes em pensamento constantemente. E, quando presentes, se mostram longe nos ideais, nas realidades que vivem e nas marcas da idade que carregam. No papel da bela mulher, capaz tanto de se apaixonar quanto de matar, está Kate Winslet, a favorita ao Oscar de melhor atriz, numa atuação comovente e emocionante.

E, para terminar, não poderia faltar nessa listagem o campeão de indicações: Quem quer ser um milionário?. Diferentemente de O Leitor ou A Troca, Quem quer ser um milonário? não te joga ou mostra conflito algum, apenas, uma realidade. A realidade indiana, muito além do que se vê em Caminho das Índias. Se, na novela, a realidade é a beleza das rígidas tradições do país, no filme é a daqueles que vivem na miséria e que exploram a Índia na mesma medida em que são explorados por ela. E o único ponto em comum entre ambos é a paixão que move seus protagonistas. Em muito se parece com o nosso Cidade de Deus, pela triste realidade retratada de forma bem-humorada e pelo ritmo da montagem - por sinal, a edição está entre seus pontos fortes e, não por acaso, é o preferido para ganhar o Oscar da categoria.

O carnaval está aí, mas os que não gostam da folia ou não podem curti-la, que recorram a uma sala de cinema fresquinha, com poltronas reclináveis e filmes tão complexos quanto a própria vida para entretê-los. Embora a cadeira confortável não exclua o desconforto com que se sai de alguns deles...